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Casarão no Fonseca renasce como Centro Cultural Cauby Peixoto
Imóvel centenário será inaugurado como o primeiro centro cultural público da Zona Norte de Niterói
Casarão no Fonseca renasce como Centro Cultural Cauby Peixoto
Foto do autor Pedro Menezes Pedro Menezes
Por: Pedro Menezes Data da Publicação: 01 de agosto de 2025FacebookTwitterInstagram
Fachada do futuro Centro Cultural. Foto: Laura Magro/A TRIBUNA

Quem passa apressado pela Alameda São Boaventura, uma das artérias mais movimentadas de Niterói, dificilmente imagina o tesouro que repousa por trás dos tapumes de obra no coração do Fonseca.

Mas é só atravessar o portão para entrar numa cápsula do tempo: um casarão centenário está prestes a renascer como o primeiro centro cultural público da Zona Norte de Niterói, o Centro Cultural Cauby Peixoto.

O nome é uma homenagem ao artista que morou no bairro, mas a alma da casa pertence a outro personagem: Álvaro Mendes de Oliveira, um português que fugiu da Primeira Guerra e fincou raízes no Brasil. Banqueiro e dono de uma fábrica de bananadas, Álvaro foi um dos motores do desenvolvimento do Fonseca.

A casa era tão grande que abrigava não só a família, mas costureiras, empregadas, trabalhadores e até um cômodo reservado exclusivamente ao padre da paróquia local. “Casamentos, batizados e velórios… tudo era feito ali dentro”, conta o arquiteto responsável pela obra, Marcelos Barcellos.

Um passado enterrado no quintal

Ritmo das obras é intenso. Foto: Laura Magro/A TRIBUNA

Do outro lado da rua, onde hoje funciona uma clínica nefrológica, antes operava a famosa fábrica de bananadas e mariolas da família, chamada Regina. E todo o quarteirão ao redor do casarão - onde hoje surgem prédios e condomínios com o nome dos filhos de Álvaro - já pertenceu ao patriarca.

Álvaro teve três filhos, já falecidos. Dos quatro netos, três vivem em Portugal e uma em São Francisco, aqui mesmo em Niterói. Mas quem guarda os segredos da casa agora é a equipe de restauração.

Piso de madeira, desenhado à mão. Foto: Laura Magro/A TRIBUNA

Logo na entrada, o chão impressiona: o piso de madeira do hall, com um desenho feito à mão, precisou ser completamente redesenhado. “Foi um trabalho hercúleo”, conta Marcelos. Assim como as ondulações da fachada, que, a olho nu, pareciam triviais.

“Achamos que era textura de fundo de garrafa”, brinca ele. Mas a realidade foi bem diferente: ninguém sabia como aquelas ondas haviam sido feitas. A solução? Reproduzir uma a uma, à mão. Um único funcionário consegue fazer. “Mão de anjo”, apelidaram os colegas.

Detalhe das ondulações, feitas à mão. Foto: Laura Magro

Uma infinidade de relíquias

As paredes não falam, mas os objetos esquecidos no casarão revelam histórias. Em uma sala improvisada de administração da obra, sobre a mesa, repousa uma pequena arqueologia doméstica: uma chapa de propaganda imobiliária (com ofertas de terrenos onde hoje está o Plaza Shopping), louças inglesas, moldes para interruptores, telhas antigas, garrafas, moedas, latas de leite de magnésia e até uma aveia Quaker - produzida, veja só, em São Gonçalo.

Relíquias encontradas no imóvel. Foto: Laura Magro/A TRIBUNA

Tudo para ser catalogado e, na medida do possível, replicado. Os vitrais, por exemplo, estavam quebrados, mas serviram como molde para cópias fiéis. Um deles, em especial, chama atenção: dividido em três partes, mostra dois pássaros juntos, depois dois pássaros com três filhotes e, por fim, os filhotes voando. “Uma metáfora da família”, diz o arquiteto.

Há também um quarto, hoje transformado em banheiro, que guarda uma história de causos de assombração. “Diz a lenda que o padre morreu ali dentro. O quarto foi fechado, e as netas nunca mais entraram”, relembra Marcelos. “Medo de assombração!”

Detalhe do vitral, que representa a família do Álvaro. Foto: Laura Magro/A TRIBUNA

Do escombro à arte

O trabalho da equipe de Marcelos começou com um mapeamento completo da estrutura. “A primeira coisa que a gente faz é mapear tudo. Móveis, pisos, o estilo arquitetônico. Fizemos contato com a família e conseguimos fotos antigas”, explica.

A arquitetura segue o estilo “Mission Style”, um movimento eclético de influência espanhola que floresceu nos Estados Unidos nos anos 1920. “Parece aquela casa de vó que todo mundo conhece”, define Marcelos. Arcos, telhas, caquinhos e tudo mais que remetesse à época foi preservado ou reproduzido. O brasão português no alto da casa, por exemplo, estava em ótimo estado e só precisou ser limpo e reinstalado.

Planta do projeto. Foto: Laura Magro/A TRIBUNA

Uma das relíquias mais curiosas surgiu de onde menos se esperava: um dos pisos importados apareceu numa loja em Madureira: “Foi um achado!”

A cor original da fachada também surpreendeu. “Todo mundo achava que era branca, mas descobrimos que era creme, o que foi confirmado por uma das netas”, revela o arquiteto.

Uma nova função, sem perder a alma

Como ficará a fachada do Centro Cultural. Foto: Reprodução

O investimento na restauração é de R$ 16,8 milhões. A entrega está marcada para 22 de novembro, aniversário da cidade. E a transformação vai além da estética: o casarão agora abrigará um centro cultural completo.

Além da casa restaurada, um terreno nos fundos está recebendo um teatro com 240 lugares. A arquibancada já desenha sua silhueta no concreto. A nova estrutura também terá biblioteca, sala de leitura, brinquedoteca, salas multiuso, coworking, cafeteria e elevador panorâmico. As salas também poderão abrigar exposições, tanto fixas, como rotativas.

Como será a sala de teatro. Foto: Reprodução

“É uma conquista histórica da Zona Norte”, comemora o secretário das Culturas, Leonardo Giordano. “Mais do que restaurar um imóvel, estamos entregando um espaço de cultura vivo, plural e acessível. O Centro Cultural Cauby Peixoto nasce como um símbolo da cidadania cultural e do compromisso da cidade com a descentralização das políticas públicas.”

Imagem do imóvel antes do início das obras. Foto: Reprodução

Para o prefeito Rodrigo Neves, o espaço é um presente à cidade. “Essa joia do Fonseca passou anos abandonada e, hoje, a Prefeitura atua para ressignificar esse espaço e expandir o seu potencial cultural. Queremos entregar esse presente no aniversário da cidade.”

Imagem do imóvel antes do início das obras. Foto: Reprodução

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